DA SÉRIE “FIGURAS HISTÓRICAS” – DONA LABIBE BARTOLO - Parte 4
Jornal Diário da Amazônia - 22 de Janeiro de 2005
ELA ESTAVA NA FESTA DA INSTALAÇÃO DE PVH
ZK – A senhora nasceu em que ano?
Labibe Bartolo – Nasci em Manaus no dia 13 de Maio de 1909, filha de Munhanrad Aiech e Maria Abran Elias. Tem uma coisa, tenho duas identidades. Acontece que quando eu nasci meu pai estava fazendo um tratamento nos dentes e teve problema e no vai-e-vem do tratamento, o dentista disse que ele que deveria procurar outro lugar mas avançado para cuidar dos dentes. Em conseqüência dessa perturbação ele se esqueceu de me registrar, quando se lembrou, meio agoniado ao me registrar errou a data do meu nascimento. Em vez de colocar 13 colocou 17 de maio.
ZK – Com quantos anos a senhora veio para Porto Velho?
Labibe Bartolo
– Em 1912, portanto quando eu tinha apenas 3 anos de idade minha família se
mudou para Porto Velho, não lembro bem, eu era muito criança e não gravei muito
essas coisas, acho que meu pai chegar aqui montou um restaurante muito grande.
ZK – Fale um pouco sobre sua vida em Porto Velho?
Labibe Bartolo
– Quando eu ainda era solteira morei na Campos Sales por muito tempo. Quando eu
me casei fui morar numa casa da Estrada de Ferro. Meu marido foi pra Guajará
substituir o encarregado da Madeira Mamoré, lá não demoramos muito porque minha
mãe achava que viver longe da filha aí o Aluízio (coronel) mandou buscar meu
marido de volta pra cá.
ZK – Quem era o seu marido?
Labibe Bartolo
– Era Joaquim Francisco Barros, ele era
contratado da Madeira Mamoré como Técnico Especializado.
ZK – A senhora é a única pessoa viva, pelo menos que eu conheço, que viu e participou das festas de criação do Município em 1914 e da Instalação no dia 24 de janeiro de 1915. Alias, quando Jonathas Pedrosa instalou o Município a senhora estava presente a completar seis anos de idade. Lembramos que o capitão Esron de Menezes também estava presente na festa de instalação do município de Porto Velho, só que era um bebezinho de um mês. Dona Labibe o que a senhora lembra daquele 15 de janeiro de 1915?
Labibe Bartolo – Eu lembro do prefeito Guapindaia eu o conheci bastante, ele era uma pessoa forte, uma pessoa formidável. Essa rua que hoje chamam de Rogério Weber tinha o nome de Major Guapindaia. Quando ele (Guapindaia) chegou aqui instalou foi morar numa casa cedida pela administração da Estrada de Ferro, depois ele teve uma pendenga com o pessoal da Madeira Mamoré e a casa foi tomada.
ZK – E a sede da prefeitura era aonde?
Labibe Bartolo
– A prefeitura mesmo! Não tem aquele prédio onde foi o café Santos na Sete com
a Prudente de Moraes e em frente o café Santos não tem um outro prédio. Pois,
justamente onde construíram esse prédio em frente ao café Santos pela Prudente
foi a primeira sede da Prefeitura Municipal de Porto Velho.
ZK – A senhora falou que a Estrada tomou a casa de Guapindaia em virtude de uma pendenga. Qual foi a confusão?
Labibe Bartolo
– Acontece que a Estrada autorizou um cidadão a construir um comercio numa área
que o Guapindaia dizia que era da Prefeitura. Parece que o Guapindaia mandou
derrubar essa casa por causa disso a administração da Madeira Mamoré tomou a
casa dele. Foi ai que começou a construção do Mercado Municipal, que só
terminou muito depois e veio a pegar fogo já na década de sessenta.
ZK – Quando criança a senhora estudou em qual colégio?
Labibe Bartolo
– Olha menino, deixa eu te dizer, o que estudei aqui não passou do terceiro ano
primário.
ZK – E aonde era o colégio?
Labibe Bartolo
– O colégio era ali onde é o Correios na Sete com a Presidente Dutra. Era uma
casa de madeira dividida ao meio, uma espécie de barracão, de um lado
funcionava o colégio e do outro servia até como igreja.
ZK – Era essa que chamavam de “vaticano”?
Labibe Bartolo
– Não, vaticano era outra casa em outro local, não to lembrada onde ficava o
vaticano, parece que era ali pelo lado da praça Rondon.
ZK – Em outra aula que a senhora me proporcionou soube das suas atividades artísticas, agora conte para os leitores sobre essa atividade?
Labibe Bartolo
– Na Porto Velho da minha juventude eu fui tudo. Fui atriz, poeta declamadora,
cantora lírica e cantora de musicas populares.
ZK – Quer dizer que sua família trabalhava com teatro?
Labibe Bartolo
– Era! Meu marido era cômico, eu gostava de drama. Cantei muito, muito mesmo,
hoje, não sei como, perdi minha voz, fico muito triste com isso.
ZK – É verdade que a senhora conheceu a Bidu Sayão?
Labibe Bartolo
– Pessoalmente não, conhecia o trabalho dela através dos jornais e revistas da
época, porem, conheci uma grande cantora lírica que era aqui de Porto Velho a
Blanca Antoni que fez sucesso cantando por esse Brasil.
ZK – A senhora se apresentava aonde?
Labibe Bartolo
– No clube Internacional que era um barracão de madeira (pino de riga) que
também era dividido ao meio, de um lado, funcionava uma escola e do outro as
atividades do clube propriamente ditas. O Internacional ficava justamente onde
hoje é o Ferroviário ali na Sete de
Setembro, sarau, festa, jantares dos categas, reuniões da marçonaria, jogo de
bacarat enfim...
ZK – Sendo a senhora uma pessoa envolvida com os movimentos culturais naquela época, com certeza se envolveu com bloco carnavalescos. Conte como era o carnaval naquele tempo?
Labibe Bartolo
– Era muito diferente de hoje. Eu tenho ai um quadro onde apareço
fantasiada, era o carnaval de 1936.A
fantasia era comportadinha, tinha meia e tudo o pessoal só que era um bloco ou
que era fantasia de bloco, por causa do nome do bloco que era pintado no
chapéu, “Bloco Noroeste”.
ZK – Noroeste era um clube?
Labibe Bartolo
– Era um clube de futebol. Nós tínhamos o Elias Gorayeb que era um grande
comerciante na Sete de Setembro que foi quem fundou esse clube Noroeste.
ZK – O que a senhora sabe sobre o Aluízio Ferreira?
Labibe Bartolo – Ele chegou por aqui como refugiado da
revolução. Vinha do Pará, depois que foi anistiado substituiu o Major Amarante
no comando da Comissão Rondon era uma pessoa muito boa. Pelo menos o que eu
tenho hoje agradeço a ele. Ele foi o primeiro administrador brasileiro da
Estrada de Ferro Madeira Mamoré, o primeiro governador do Território Federal do
Guaporé e o primeiro deputado federal do Território.
ZK – Desde quando a senhora mora no bairro Caiari?
Labibe Bartolo – Viemos morar nesta casa (na Duque de Caxias com a Rogério Weber) em 1945.
ZK – Quer dizer
que a senhora mora aqui desde quando nasceu o bairro Caiari?
Labibe Bartolo
– Quem primeiro morou nesta casa foi Araújo Lima que foi governador do
Território e Diretor da Estrada de Ferro. Depois construíram a casa que a gente
chama “do governador” e que hoje, é o Memorial Jorge Teixeira, e ele se mudou
pra la e nós viemos morar aqui. Hoje essa casa é minha, alias, nós pagamos por
ela, acho que eles deveriam ter me dado essa casa de presente.
ZK – Por falar nisso, a senhora já foi homenageada pela Assembléia Legislativa ou pela Câmara dos Vereadores, Governo do Estado ou Prefeitura?
Labibe Bartolo
– Olha meu filho, pra não dizer que não fui homenageada, quando a menina Helen
Ruth era vereadora, me deu um certificado de “Amiga de Porto Velho”. Depois
disso, nunca recebi homenagem nenhuma e olha que moro
ZK – A senhora falou do Bloco Noroeste. Esse bloco desfilava na rua ou se apresentava apenas nos clubes?
Labibe Bartolo
– Agente desfilava na rua, naquele tempo tinha aquele caminhões que durante o
carnaval eram como se fossem alegóricos, a gente ia em cima e passava pela
avenida dos desfiles em frente ao palanque das autoridades, era assim. Depois a
gente brincava nos clubes também.
ZK – O Bloco brincava em qualquer clube?
Labibe Bartolo
– Tem um detalhe, naquele tempo, existia a divisão social. Tinham clubes dos
Categas, Internacional, Ypiranga, depois veio o Bancrévia. O clube da classe
média: Danúbio Azul e Guaporé, Clube do povão era o Imperial do seu Alumínio.
Era cada um na sua sociedade.
ZK – Fale sobre a famosa rua da Palha?
Labibe Bartolo
– Porque as casas eram cobertas de palha
em sua maioria. Foi a primeira rua de Porto Velho rapaz!
ZK – É verdade que ali existiu o primeiro cinema de Porto Velho?
Labibe Bartolo
– Apareceram dois portugueses por aqui, Amaro e Benjamim Rosa dois irmãos,
foram eles que construíram o cinema Fênix todo de madeira e coberto de zinco.
Era um cine teatro.
ZK – A senhora chegou a se apresentar no Cine Teatro Fênix?
Labibe Bartolo
– Muito! Eu fui considerada pelos irmãos como sócia do teatro. Acontece que
quando eles foram viajar o João perguntou! E a Labibe como vai ficar nessa
historia. Acontece que toda via eu trabalhei lá. Eles responderam! A Labibe
fica como sócia do Corpo Cênico.
ZK – Quem era esse João?
Labibe Bartolo
– João Soares Braga um grande ator e
autor de peças teatrais ele e o Antonio Lopes, artista Profissional.
ZK – Como foi que a senhora conheceu o seu marido. Foi amor a primeira vista?
Labibe Bartolo
– Eu o conheci no teatro, a gente trabalhava na mesma companhia. Ele era ator
cômico.
ZK – Quantos filhos a senhora tem?
Labibe Bartolo
– Foram sete filhos dos quais estão vivos cinco.
ZK – A senhora gosta de freqüentar o Mercado. Fale sobre essa paixão?
Labibe Bartolo
– Hoje já não vou ao mercado porque estou de muleta, mas até pouco tempo eu ia
todo dia. É no mercado que a gente encontra os amigos e leva aquele papo, é
muito importante isso porque a gente se mantém informado sobre a cidade.
ZK – Por falar nisso! A senhora freqüenta as famosas filas da carne?
Labibe Bartolo
– Não, quem ia para a fila era minha mãe. Ela chegava no mercado a noite e
colocava a sexta lá no chão com o nome dela, quando era de manhã, ia buscar,
muitas vezes, a carne já estava pesada na sexta. Minha mãe era conhecida como
Dona Maria Turca.
ZK – E a historia da construção da Igreja Catedral?
Labibe Bartolo
– A pedra fundamental da catedral foi inaugurada justamente no local onde está
a Igreja Catedral hoje, ali em frente a Prefeitura. Acontece que logo depois,
alguém alegando que ali ficava muito longe da população resolveu construir a
Catedral no terreno onde hoje está o Palácio do Governo. Bom! Quando a
construção já estava praticamente concluída deu um temporal e derrubou tudo. Ai
o povo começou a dizer que era castigo de Deus porque tinham, mudado, o local
escolhido. Foi então que se construiu a Catedral que existe até hoje.
ZK – Dizem que os tijolos quem transportou do porto para o local da construção da igreja foi o povo. É verdade?
Labibe Bartolo
– Verdade mesmo. O povo depois do castigo do temporal, foi convocado para
ajudar a transportar os tijolos do porto até o local da construção, a gente
carregava tijolo de todo jeito, na cabeça, carrinho de mão, foi assim que foi
assim que foi construída a nossa Catedral do Coração de Jesus.
ZK – É verdade que na rua da Palha existiam casa de prostitutas?
Labibe Bartolo
– Não era bem na rua da Palha, era na curva, já pro lado do Morro do Querosene,
Baixa da União, por ali. Naquela área tinha até professora de sexo.
ZK – Professora de sexo?
Labibe Bartolo
– Morava lá uma prostituta conhecida como Anita Olho-de-vidro que ensinava como
fazer sexo. Os pais levavam os adolescentes para ela ensinar com tratar uma
mulher na hora do sexo.
ZK – Para encerrar! O que a senhora tem a dizer sobre os 90 anos de Porto Velho?
Labibe Bartolo – Gostaria de dizer ao novo Prefeito Roberto Sobrinho que cuide bem da nossa cidade, não deixe ela ficar suja, seja de lixo ou de marginais. Precisamos de praças, de muita atividade cultural, de um teatro, enfim, precisamos brincar carnaval de verdade. Que Deus ilumine a administração do prefeito e que Porto Velho seja amada e respeitada por todos. Parabéns!
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