A ESTRADA DE FERRO MADEIRA-MAMORÉ - PARTE 4
>> Continuação da parte número 3 dessa cativante história.
Membros da Comissão de Estudos da Estrada de Ferro do Madeira e Mamoré 1882-1883
Fracassam os americanos
Face o pânico verificado entre os investidores da Bolsa de Londres com os rumos da construção da ferrovia, o Cel. Church tentou restabelecer a confiança no empreendimento, conseguindo que uma empreiteira americana, a Dorsay & Caldwell assumisse o compromisso de construir os primeiros 15 km da ferrovia, apenas utilizando-se dos materiais abandonados em Santo Antônio pela Public Works. Para isso, um contrato foi assinado em 17.09.1873 e em 24.01.1874 chegou a Manaus um grupo de engenheiros e ajudantes, decididos a tomar as medidas e providências necessárias para a retomada do empreendimento. Porém, dias após sua chegada à Santo Antônio, o grupo volta, devido ao falecimento de um dos seus integrantes, tendo portanto fracassado mais uma empresa em lançar mão da contrução dessa ferrovia.
A retomada da construção
Estando o Brasil bastante interessado na construção da ferrovia, o Imperador D. Pedro II encaminhou um projeto ao senado propondo que o Brasil garantisse fundos suplementares para a construção dessa ferrovia, pois aparentemente o ponto mais crítico para os tribunais ingleses, é que o custo provável da ferrovia superaria em muito o custo inicial. A proposta ao senado Brasileiro era de uma suplementação de fundos da ordem de £$ 400.000,00 e mesmo havendo forte oposição no senado, essa disposição do governo brasileiro em auxiliar a construção da ferrovia deu novo alento ao Cel. Church, que entrou em acordo com a Public Works, que retirou a ação de perdas e danos dos tribunais ingleses, permitindo que os juizes autorizassem a liberação do dinheiro do empréstimo Boliviano para a construção da estrada, porém "somente na medida em que as obras prosseguissem".
De posse dessa situação favorável nos tribunais, o Cel. Church vai tentar encontrar, nos Estados Unidos, as firmas e capitais necessários à construção da estrada de ferro, conforme veremos a seguir.
Os americanos da P. & T. Collins
Nos Estados unidos, que nessa época começavam a surgir como potência industrial, o cel. Church encontrou, nas firmas Philadelfia and Reading Coal and Iron Co., fornecedora de aço e na P. & T. Collins, tradicional e conceituada firma de engenharia, os parceiros para tocar a construção da estrada de ferro, e em 25.10.1877 foi lavrado um contrato, onde esta última assumiria, por £ 1.200.000,00 a construção da ferrovia. Apesar do preço ser o dobro do proposto pela Public Works, e haver na Inglaterra apenas 700.000 libras disponíveis para a construção dessa ferrovia, Church contava com o governo brasileiro, que desde 1873 estava analisando uma lei que garantisse mais 400.000 libras aos construtores da ferrovia, lei essa que foi efetivamente aprovada cerca de um mês após a assinatura do contrato com as empreiteiras americanas.
Collins Bros P & T Collins
Um fato curioso e promissor
Iniciam-se os trabalhos
Imediatamente após a chegada, os americanos já começaram a mandar as primeiras turmas para o serviço de campo, e mais alguns navios partiram dos EUA carregados de pessoal, materiais e equipamentos, que após diversos incidentes, inclusive com a perda total de um dos navios, chegaram ao brasil para reforçar as turmas de trabalho.
Durou pouco entretanto esse ritmo de trabalho, pois em março desse mesmo ano já começavam a surgir os primeiros relatos de doenças atacando os homens e falta de pagamento de algumas contas no Pará por parte da firma. Faltavam provisões e as equipes de trabalho que estavam em plena floresta amazônica eram obrigadas a caçar para alimentar-se. Os remédios e demais recursos também eram escassos, a ponto dos encarregados começarem a pensar em abandonar os serviços ainda nesse mês de março, o que foi contornado com a chegada de mais um vapor, que além de trazer novos animos e trabalhores, trouxe o presidente da firma P. & T. Collins, que, tendochegado para supervisionar pessoalmente os serviços, injetou novo animo no pessoal e começaram a ser construídos edifícios, padarias, etc...
Par e passo o relato dos engenheiros das inomináveis dificuldades em se avançar pela floresta tropical, o encontro com animais exóticos e venenosos e o ataque dos índios, a construção da ferrovia prosseguia lentamente, mas em maio as doenças já haviam atingido a todos. A malária estava grassando sem piedade entre os homens. Novamente começava a faltar viveres, remedios, etc.., e uma parte grande dos homens menos doentes saía diariamente para caçar ou pescar para alimentar o acampamento.
Embora a situação financeira da firma fosse dificil e o Cel. Church não estivesse conseguindo levantar os fundos congelados na Inglaterra, havia uma determinação forte dos americanos em prosseguir na construção da ferrovia, de forma que, mesmo atacados por doenças, sofrendo da falta de alimentos e remédios e trabalhando em condições sanitárias péssimas, no dia 4 de julho de 1878 foram inaugurados os primeiros 3 kilômetros de trilhos, com uma pequena locomotiva, a cel. Church fazendo esse percurso e descarrilando em uma curva....
Moradores de Santo Antonio do Madeira em 1912, em evento religioso caminhando pela passarela construída sobre a antiga linha férrea construída pela P & T Collins e segundo consta a locomotiva teria tombado nesta curva mal desenhada. Revista O Malho.
A essa altura dos acontecimentos, era evidente que o projeto encaminhava-se para um triste fim, pois estavam previstas a conntrução de 10 km de trilhos por mes, e nos primeiros 4 meses foram assentados apenas esses tres km iniciais, de forma que a produção estava sendo de apenas 10% da prevista. Para piorarainda mais esse quadro, em 16.07.1878 é recebida uma carta do cel. Church onde esse admite que não conseguirá desbloquear os recursos depositados no banco da Inglaterra e portanto não terá como pagar o empreiteiro e, mesmo que houvesse possiilidades, o pagamento contratual por esses 3 km de trilhos assentados não cobriria nem de perto os gastos da P. & T. Collins para a sua colocação.
Essa notícia, em conjunto com o corte do crédito da firma em Belém do Pará e nos Estados Unidos, selaram o desastre que foi a tentativa de P. & T. Collins de construir uma ferrovia nessa região. Às dezenas, depois centenas e de todas as formas, os trabalhadores começaram a desertar da empresa, chegando a Belém do Pará com a roupa do corpo, sendo obrigados a mendigar alimentos e remédios até obter passagem de volta aos EUA, o que foi providenciado pelo Consul Americano, que conseguiu junto ao governo americano um vapor para "carregar" cerca de 300 pobres-coitados que 6 meses antes haviam chegado cheios de esperança e vida à região das cachoeiras de Santo Antônio.
Permaneceu em Santo Antônio o presidente da P. & T. Collins, juntamente com um fiel grupo de engenheiros e técnicos que, sabendo-se falidos, entendiam que a única esperança seria o prosseguimento dos serviços, na esperança do cel. Church conseguir receber os créditos bloqueados em Londres, esperança essa que desvaneceu-se quando chegou a Santo Antônio em 16.02.1879 um perito nomeado pelos tribunais londrinos para atestar se seria possível ou não a construção da ferrovia, e após vistoriar os primeiros 6 km já construídos, cretornou a Londres com um relatório desfavorável à empresa Collins.
A pequena Locomotiva Baldwin batizada de Coronel Church abandonada em Santo Antonio do Rio Madeira pela empresa P&T Collins, encontrada em 1908 pela empresa May, Jeckyl and Randolph e restaurada em 1912 sendo uma das locomotivas usadas a inauguração da EFMM neste mesmo ano. Foto: Engenheiro-chefe da MMRY.
Era mais uma empresa que fracassava na região, tendo retirado-se derrotada após 18 meses na região, contabilizando cerca de 141 mortes entre as 719 pessoas que vieram dos Estados Unidos para trabalhar na ferrovia. Faleceram ainda cerca de 300 a 400 trabalhadores brasileiros e bolivianos. Particularmente, o Sr. Collins perdeu tudo o que tinha e sua esposa enlouqueceu, sendo internada em um Sanatório. O cel. Church, perdido mais esse "round", desiste da construção da estrada, levando os tribunais londrinos a ratearem o valor depositado entre os investidores e o Brasil a declarar caduca, em 1881, a concessão para a construção da ferrovia. A construção da ferrovia parecia cada vez mais um sonho distante e impossível.
>>> continua....
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